SHERNO ou memórias da guerra na Guiné

 

A  PRIMEIRA  SENTINELA

 

        

 

ui a Brá ver a escala de serviços e lá estava o meu nome indicado, para fazer sentinela, da meia-noite às duas horas da manhã, nos postos avançados.

         Depois de jantar para lá me dirigi ...  seguindo de imediato para o  depósito de materiais, onde levantei a arma e as cartucheiras. Requisitei também um cobertor cinzento, para me enrolar por causa das melgas ... e mais tarde para dormir.

         Chegada a hora, um cabo foi-me levar ao posto de serviço, onde se encontrava o outro sentinela à espera de ser rendido.

         As duas horas passaram depressa e depois de ser rendido vim com o cabo para cima, entregando a arma e as cartucheiras, mas não o cobertor que ficou comigo para dormir.

         O cabo indicou-me uma caserna para passar o resto da noite. Entrei às apalpadelas porque não havia luz e lá me consegui acomodar. As camas deviam ser mais de 100 e nenhuma delas tinha colchão. Segundo observei, deviam estar lá 15 ou 20 soldados a pernoitar no máximo.

         Enrolei-me no cobertor e deitei-me. À minha volta não havia ninguém. As camas estavam completamente desocupadas.

         Adormeci e acordei por volta das 5,30 h, quando já se começava a notar alguma claridade ... mas o meu cobertor tinha desaparecido.

         Fiquei danado. Olhei à minha volta e vejo na cama mesmo ao lado, um latagão a dormir enrolado a um cobertor. Pensei logo:

         - Não há dúvida que foi ele! Pois quando me deitei não havia aqui ninguém.

         Dirigi-me a ele e comecei-lhe a puxar o cobertor, ao mesmo tempo que lhe chamava ladrão. E ele balbuciava:

         - Hã ... hã ... hã... Abria os olhos, olhava para mim:

         - Hã ... hã ... hã ... Eu puxava, ele facilitava, até que lho consegui tirar sem que tivesse acordado.

         - Bom. - Pensei eu:

         - O melhor é não me deitar mais. Vou entregar já o cobertor e depois vou-me embora, antes que haja merda.

         Quando cheguei cá fora fiquei espantado ... afinal o cobertor não era o meu. O  meu era cinzento e aquele era castanho. Grande bronca ...  coitado do rapaz, chamei-lhe ladrão e afinal até é sério. Lamentei o sucedido mas já não podia voltar atrás, caso contrário quem tinha de pagar o cobertor era eu.

         Nisto comecei a lembrar a cena e desatei a rir que nem um perdido ... certamente que o sacana que roubou o meu também me pôs a balbuciar. 

         - Hã ... hã ... hã.