SHERNO ou memórias da guerra na Guiné |
O BARROCA FOI MORDIDO NO CALCANHAR
s dias iam passando lentamente, com chuva, ataques ao aquartelamento e emboscadas. O medo apoderava‑se cada vez mais de nós. Vivíamos um terrível pesadelo, que ia aumentando sempre mais, a cada minuto que passava.
Numa tarde, saímos acompanhados com um pelotão pertencente à Companhia Operacional de Tite, a fim de fazermos um reconhecimento através da selva.
Conforme prosseguíamos calmamente, fomos alertados pelos gritos do Barroca, que dizia ter uma mina debaixo do pé direito.
Parámos à distância não fosse o Diabo tecê-las e irmos todos pelos ares, juntamente com ele.
Com a maior das precauções, o furriel Pulido aproximou‑se dele e disse‑lhe:
‑ Mas tens a certeza?
O Barroca confirmou que sim, porque sentiu o engenho a engatar, e se tirasse o pé ia pelos ares.
Valeu‑lhe a experiência que adquiriu ao longo dos meses, caso contrário teria sido mais um mutilado das Forças Armadas.
O Barroca suava em bica, enquanto o furriel Pulido lhe ia tirando a arma, a camisa, e a bota esquerda.
Tirou‑lhe tudo o que pode, deixando‑lhe só as calças e, inevitavelmente a bota direita.
Enquanto o furriel o ia libertando de todos os pesos possíveis, nós a uma certa distância, íamos tentando encorajá‑lo. O furriel afastou‑se então e disse-lhe:
- Coragem. Nós vamos contar até três e tu vais saltar!...
O Barroca saltou para a frente e levantou voo, ficando todo mascarrado com a poeira que o rebentamento provocou ... Chegámos a pensar o pior, mas graças a Deus, a maldita mina, só lhe conseguiu morder o calcanhar, e o Barroca, passados quinze dias estava felizmente curado.