SHERNO ou memórias da guerra na Guiné

 

A PARTIDA

 

        

 

o dia 22 de Dezembro de 1970, às 10 horas da manhã deixámos o Quartel de Adidos, novamente em camiões e silenciosamente sem grandes alaridos ou manifestações de alegria, atravessámos a cidade até ao cais onde estava atracado o navio Uíge à nossa espera.

         Conforme deixámos os camiões, deparámos com uma grande algazarra dos estivadores Guineenses que carregavam os nossos materiais, desde caixotes que prendiam nos guindastes e que depois de bem amarrados gritavam para que fossem içados. Assim como as urnas que continham os restos mortais dos nossos jovens camaradas. que perderam a vida no auge da sua juventude a lutar pela Pátria.

         Às 14 horas o barco deu o último apito, começando logo de seguida a deslizar suavemente pelas águas do rio Cacheu, pilotado por um comandante guineense bastante conhecedor do rio e da sua profundidade.

         Acompanhavam o navio três vedetas da Marinha, duas atrás e uma à frente.

         A bordo vínhamos 1.800 militares, para quem a guerra felizmente tinha acabado.

         O Batalhão de Cavalaria 7 embarcou doze dias depois. Para lá fomos todos juntos, mas desta vez quis o destino que eles fossem mais infelizes e viessem mais tarde, impedindo‑nos por este motivo de nos voltarmos a ver

         O navio deslizou suavemente durante 2 h 30 por um canal estreito e profundo, mostrando‑nos selvas esplendorosas em ambas as margens.

         De vez em quando avistávamos ao longe aldeias e acampamentos com as nossas tropas e gente da população, que nos acenavam com um adeus.

         Eram 16 h 30 quando, chegámos ao fim do canal e avistámos o alto mar, o navio semi-parou, e a vedeta que se encontrava à frente desceu um Zebro e veio buscar o comandante guineense, que até ali tinha vindo a pilotar o navio.

         Depois de subir à vedeta, acenou com a mão dizendo adeus: o navio apitou e novamente prosseguiu viagem desta vez rumo à metrópole.